quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Direito de Resposta por Ofensa à Honra em matéria veiculada pela Rede Globo



Minhas considerações sobre a reportagem veiculada no Fantástico do último domingo, com o desastroso título “Advogados Espertalhões”.
Apesar de há muito não assistir o referido programa da malfadada emissora, chamou-me atenção a Nota Pública emitida pelo Conselho Federal e Colégio de Presidentes da OAB naquele dia. Então, confesso que esperei ansiosa pelo semanário daquele dia, ansiosa e preocupada por conhecer o sensacionalismo sempre utilizado de forma deplorável pela Rede Globo.
Chegada a hora deixei a TV ligada, como não consigo assistir, fui para frente da tela somente no momento da reportagem pretendida. Enquanto fazia coisas mais interessantes, ouvia as chamadas feitas pelo programa a cada fim de bloco e custei a acreditar no que estava ouvindo... Algo assim: “Em instantes, a reportagem especial desse domingo do Fantástico vai mostrar a triste realidade de trabalhadores rurais muito humildes que, na tentativa de receberem suas aposentadorias, esperam por anos e são enganados por advogados espertalhões”. Obviamente, minha preocupação aumentou.
Enfim, a reportagem começa a ser exibida. Farei aqui um parêntese, já que não resisti em expressar o que veio a mente ao digitar a última palavra: EXIBIDA, um perfeito adjetivo a ser atribuído a Rede Globo de Televisão, não?!
Voltemos à matéria. Assisti, muda, calada (coisa rara), quase sem piscar, analisando cada fala, cada pergunta, cada gesto mostrado pelas câmeras e a trilha sonora usada. E aqui começo minhas considerações:
1 – Meu primeiro questionamento vai para aqueles que tem o dever de defender seus representados: o que, das gravações, foi mostrado à OAB Federal para tão fraca defesa, leia-se Nota Pública, à classe divulgada no dia da exibição da matéria? Porque o escolhido para defender a instituição e falar à Rede Globo foi nosso Secretário-Geral Adjunto do Conselho Federal, digamos que o quarto nome em hierarquia, e não nosso Presidente Nacional, que é quem sempre aparece em pronunciamentos “políticos”, sessões solenes no STJ e STF ou se for para dar boas notícias? A meu ver, num momento tão delicado, como esse que se apresenta para a classe, não poderíamos esperar menos do nosso Presidente. A propósito, tenho observado os membros da direção da OAB, seja do Conselho Federal ou da Seccional, meio que desconversando. Evitando tocar no assunto, basta ver seus últimos posts em redes sociais. Porque a inércia?! O caso pede uma imediata reação.
2 – Após, quero deixar claro que minha indignação se justifica pela generalização dada a reportagem. Tendo em vista que, toda generalização é um erro, estou aqui na defesa daqueles profissionais éticos, que assim como eu, se sentiram atingidos e incomodados com mais uma tentativa de desmoralizar a classe. Como se todos os advogados, sem exceções, exercessem seu mister como aqueles apresentados na matéria, como se em outras tantas profissões, não encontrássemos mal profissionais. Não estou aqui na defesa dos advogados que exercem sua advocacia à margem do Código de Ética e do Estatuto da Advocacia. Para tanto, elenco algumas das infrações cometidas pelos advogados apresentados na matéria, e defendo a rigorosa punição aos mesmos, que deve ser feita pelo Tribunal de Ética e Disciplina da OAB, já que somos os maiores interessados de que tudo seja esclarecido e a advocacia séria e ética saia vencedora e fortalecida deste triste episódio.
2.1 – A declaração de uns dos advogados citados na matéria e entrevistado: “Essa ação civil pública do Ministério Público é um absurdo. O Ministério Público só tem um foco nessa questão: é a autopromoção de um promotor incompetente, que propôs uma ação pública absurda.[...]”, diz o advogado.
A quem devo lembrar os art. 33 e 44 do nosso Código de Ética:
Art. 33. O advogado deve abster-se de:[...]
III – abordar tema de modo a comprometer a dignidade da profissão e da instituição que o congrega;
Art. 44. Deve o advogado tratar o público, os colegas, as autoridades e os funcionários do Juízo com respeito, discrição e independência, exigindo igual tratamento e zelando pelas prerrogativas a que tem direito.
Devo aqui também citar, na mesma linha, o art. do Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei 8.906/94): “Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos.” Desnecessário comentar, não?!
2.2 – Para o caso do advogado mineiro que se juntou ao vereador da cidade e também presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais, vulgo “Tindico”, o apelido diz tudo, temos o art. 34, da mesma Lei, no Capítulo das infrações e sanções disciplinares:
Art. 34. Constitui infração disciplinar:
[...]
III- valer-se de agenciador de causas, mediante participações nos honorários a receber;
IV – angariar ou captar causas, com ou sem a intervenção de terceiros;
2.3 – E para todos os casos citados na reportagem:
Art. 31 do Estatuto da Advocacia:
“O advogado deve proceder de forma que o torne merecedor de respeito e que contribua para o prestígio da classe e da advocacia.”
E ainda, os artigos do Código de Ética, do Capítulo V, que trata dos honorários profissionais:
Art. 36. Os honorários profissionais devem ser fixados com moderação, atendidos os elementos seguintes:
[...]
IV – o valor da causa, a condição econômica do cliente e o proveito para ele resultante do serviço profissional;
Art. 38. Na hipótese da adoção de cláusula quota litis, os honorários devem ser necessariamente representados por pecúnia e, quando acrescidos dos de honorários da sucumbência, não podem ser superiores às vantagens advindas em favor do constituinte ou do cliente.
Vale aqui uma ressalva, os 20% insistentemente citados na reportagem, não se trata de um limite imposto pela OAB. A Tabela da OAB, de cada Seccional é independente, e não impõe limites máximos de cobrança, apenas orienta quanto aos valores mínimos de honorários que devem ser cobrados. A menção de limitação em 20%, encontramos somente no Código de Processo Civil, em seu artigo 20, e diz respeito somente ao honorário sucumbencial, isto é, aquela verba paga pelo vencido ao advogado da parte vencedora. E nada menciona, e não poderia, quanto a limitações dos honorários contratuais.
Art. 20. A sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios.[...]
[...]
§ 3º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez por cento (10%) e o máximo de vinte por cento (20%) sobre o valor da condenação, atendidos:
a) o grau de zelo do profissional;
b) o lugar de prestação do serviço;
c) a natureza e importância da causa, o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
Finalizo com algumas das fundamentações para que os profissionais envolvidos na reportagem sejam exemplarmente punidos, caso restem comprovadas as alegações apresentadas, e volto as minhas considerações sobre toda a matéria.
3 – Torna-se imperativo perguntar, porque a matéria não abrangeu a necessidade dos agricultores, que já possuíam o direito a sua aposentadoria, procurarem advogados para interporem ações judiciais para tanto? Tratando-se de direito adquirido, porque o INSS não concede o benefício de aposentadoria aos ruralistas? Sim, porque para vc que não é do ramo, saiba que a justiça EXIGE que o cidadão, antes de propor ação judicial contra INSS pleiteando a aposentadoria, faça o pedido administrativo ao órgão, que quase SEMPRE é negado. Daí a necessidade de contratar advogados e pagar honorários por um direito que lhe assiste. Aí está o grande absurdo, que sequer foi mencionado na reportagem.
A propósito, onde estão os Defensores Públicos destas cidades? Porque não foram procurados pelos agricultores para a propositura da ação? Eles existem para isso, recebem bons salários do Estado para atenderem este povo humilde apresentado pelo Fantástico.
E digo mais, e os acordos propostos pelo INSS que muitas vezes beiram os 60%, ou seja, com a promessa de pagar rápido, o INSS oferece ao segurado um desconto de 60% dos atrasados. Desta forma, o segurado receberá somente 40% do que seria devido a ele, e como na maioria dos casos, essas pessoas estão em estado de vulnerabilidade, pois são hipossuficientes e aceitam. Ah, mas o INSS pode ficar com valor maior que o segurado.
4 - Outro ponto que me incomodou bastante, foi o público escolhido para a matéria. A Globo, mais uma vez, abusou do sensacionalismo e exibiu uma reportagem deveras apelativa, quando mostrou pessoas paupérrimas, judiadas pela exposição de uma vida ao sol, mãos calejadas e muitos deles portadores de doenças incapacitantes. E exibiu isso como se toda aquela desgraça ocorrera por culpa dos advogados contratados por eles. Meu Deus! E os empregadores rurais, que abusam da humildade dessas pessoas que não possuem estudo algum e por isso se veem dependentes daquele patrão, daquele “emprego”. E não é pouco, que ainda encontramos fazendas por esse país a fora com regimes de trabalho análogos a escravo. Como já dizia o Patrono dos Advogados, Rui Barbosa: “nada pode haver neste mundo mais perigoso, mais triste e mais humilhante do que a condição de se achar um homem sujeito ao arbítrio sem freio de outro homem.” O ápice da apelação ficou para o final, quando as câmeras focavam as mãos envelhecidas e calejadas de cada agricultor. Fiquei imaginando o repórter pedindo a cada um deles que mostrasse a palma de suas mãos para que fosse mostrada ao Brasil todo. Será mesmo, o advogado culpado por tanto sofrimento de uma vida inteira?
5 – Venho agora, defender a classe e dizer que, independente de qualquer injustiça ou infração cometida, não fossem os trabalhos realizados pelos colegas de profissão, toda essa gente, tão necessitada, não estariam recebendo suas aposentadorias, sem adentrar ao mérito do valor miserável que é disponibilizado aos mesmos, o que já ensejaria uma nova e longa discussão. O acesso à justiça faz-se, com poucas exceções, através de advogado.
A Constituição Brasileira, em seu artigo 133, afirma ser o advogado “indispensável à administração da justiça”. Desta forma, o advogado é a voz do cidadão, é aquele que assegura, na medida de suas possibilidades, a aplicação das leis e o respeito aos direitos de cada cidadão brasileiro. Temos a importante função de proteger a democracia brasileira, o cumprimento das leis, o respeito às instituições e principalmente a defesa dos mais vulneráveis. Com tão nobre mister, não podemos ser escarnecidos por uma emissora de televisão, ainda que esta seja tratada por nossos governantes como o quarto poder deste país. E para tanto, cito Sobral Pinto: “A advocacia não é profissão de covardes”.
Por fim, concluo clamando à OAB que não se cale diante de tão grave situação, que faça valer o lema da atual gestão: “Advogado Valorizado. Cidadão Respeitado”, que considere a indignação da grande maioria da advocacia brasileira, que se vê desrespeitada e incomodada por ser chamada de “Espertalhões”.

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