sábado, 24 de outubro de 2015

Partidos portugueses de esquerda condenam posição do Presidente da República



Jorge Horta
Cavaco Silva foi fortemente criticado pelas forças de esquerda.

Lisboa - A comunicação ao país do presidente português, Cavaco Silva, esta quinta-feira foi contundente, mas as reações dos partidos de esquerda não o foram menos. Após o discurso em que Cavaco anunciou a escolha de Pedro Passos Coelho para formar Governo, com fortes críticas às forças de esquerda, o Partido Socialita (PS), o Partido Comunista Português (PCP) e o Bloco de Esquerda (BE) vieram manifestar o seu desagrado.
Na sua intervenção, para justificar a escolha do presidente do PSD para formar o próximo Governo, Cavaco Silva (também ele um antigo presidente do PSD) argumentou que em 40 anos de democracia Portugal nunca teve no Governo forças políticas críticas da União Europeia, numa alusão clara aos programas do PCP e do BE.

"Em 40 anos de democracia, nunca os governos de Portugal dependeram do apoio de forças políticas antieuropeístas, isto é, de forças políticas que, nos programas eleitorais com que se apresentaram ao povo português, defendem a revogação do Tratado de Lisboa, do Tratado Orçamental, da União Bancária e do Pacto de Estabilidade e Crescimento, assim como o desmantelamento da União Económica e Monetária e a saída de Portugal do Euro, para além da dissolução da NATO, organização de que Portugal é membro fundador", afirmou Cavaco Silva.

O presidente português considerou que a prioridade do país é transmitir confiança aos mercados financeiros, algo que um Governo de esquerda não poderá assegurar, segundo se depreende do discurso de Cavaco Silva.

"É meu dever, no âmbito das minhas competências constitucionais, tudo fazer para impedir que sejam transmitidos sinais errados às instituições financeiras, aos investidores e aos mercados, pondo em causa a confiança e a credibilidade externa do País que, com grande esforço, temos vindo a conquistar", declarou Cavaco.

As afirmações do chefe de Estado foram mal recebidas pelos três maiores partidos de esquerda, que detêm, juntos, mais de metade dos deputados eleitos para a Assembleia da República a 4 de outubro. Esses três partidos (PS, PCP e BE) já indicaram que votação contra o atual Governo da coligação PSD/CDS.

Mesmo assim, Cavaco Silva concluiu ser preferível dar posse a um Governo minoritário PSD/PS. E frisou que na votação do programa de Governo e do Orçamento do Estado cabe aos deputados decidir se aprovam ou não esta coligação. Uma mensagem que traduz um desafio aos deputados do PS mais insatisfeitos com a liderança de António Costa para darem o seu apoio à aliança PSD/CDS.

O que se segue está rodeado de alguma incerteza. Se, como é esperado, a coligação PSD/CDS vir a Assembleia da República reprovar o seu programa de Governo (que deverá ser apresentado nos próximos 10 dias), o Presidente da República poderá convidar a segunda força política mais votada (PS) a formar Governo. Algo que Cavaco Silva está a evitar a todo o custo.

No limite, contudo, o Presidente da República poderá considerar que o país é governável com um Governo minoritário de gestão (em minoria, a coligação PSD/CDS apenas poderia governar nas condições já existentes, sem conseguir aprovar novas medidas e alterações com impacto significativo no Orçamento do Estado). Se assim for, o novo Executivo poderá ainda durar alguns meses, pelo menos até meados de 2016, altura em que Portugal já terá um novo Presidente da República (Cavaco Silva está a concluir o seu segundo mandato) e, caso permaneça sem uma maioria parlamentar, o país poderá ter de realizar novas eleições legislativas.

Catarina Martins, coordenadora do Bloco de Esquerda, reagiu à indigitação de Passos Coelho com um tom crítico, afirmando que o Presidente da República "está a comportar-se como o líder de uma seita". "Conseguiu ser mais faccioso que os piores comentários de direita que temos ouvido nos últimos tempos", declarou Catarina Martins. "O que é inaceitável é que ele traga para cima da mesa um veto sobre soluções políticas democráticas, como se as eleições fossem uma fraude", acrescentou.

Nas reações, o Partido Ecologista Os Verdes concluiu que Cavaco Silva decidiu "amparar" o PSD e o CDS, enquanto o PCP criticou o "desrespeito pela Constituição". "Esta decisão é inaceitável, revela absoluto desprezo pela vontade expressa pelo povo português nas eleições de 4 de outubro e total ausência de imparcialidade", declarou o líder parlamentar comunista, João Oliveira.

Do PS também vieram críticas. O deputado socialista João Soares destacou contradições no discurso de Cavaco Silva, notando que "o PS lamenta e estranha" a decisão do Presidente da República, por "introduzir mais confusão" no cenário político. "Inevitavelmente Pedro Passos Coelho vai cair", prevê João Soares.

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