quinta-feira, 25 de outubro de 2018

Mapa mostra como fake news relacionadas ao 'kitgay' se disseminaram entre eleitores

*o mapa em alta resolução pode ser acessado neste link

O Instituto de Tecnologia e Equidade (IT&E) produziu um mapa que mostra os caminhos percorridos por uma das fake news que viralizou durante as eleições deste ano, o chamado kit gay. No gráfico, a organização relaciona os atores, processos e influências relacionadas à notícia falsa que, no final do dia, repercute caminho semelhante para outros boatos em torno das eleições. O mapa integra o White Paper "Recomendações Sistêmicas para Combater a Desinformação nas Eleições do Brasil" e pode ser acessado no link.

Um pouco de contexto
O kit gay tem uma cauda longa antes de chegar em sua viralização, lembra o IT&E. Começa com o projeto "Escola sem Homofobia", que foi alcunhado de 'kit gay'. O projeto buscava a formação de educadores para tratar questões relacionadas ao gênero e à sexualidade como parte do programa pedagógico "Brasil sem Homofobia". A ação foi criada em 2004 e tinha o objetivo de combater a violência e o preconceito contra a população LGBT.

O material era composto por um caderno, peças impressas e audiovisuais, mas teve a distribuição suspensa, em 2011, pela então presidente Dilma Rousseff. Naquele ano, Fernando Haddad, hoje adversário de Jair Bolsonaro no segundo turno da corrida presidencial, estava no comando do MEC (Ministério da Educação).

Ao longo do período eleitoral, o livro "Aparelho Sexual e Cia", voltado para a orientação sexual de crianças e adolescentes que traz como protagonista "Titeuf", conhecido pela série em quadrinhos francesa "Zep", foi vinculado - erroneamente - por Bolsonaro ao "Kit gay", em especial na entrevista ao "Jornal Nacional", da Rede Globo, no final de agosto deste ano.

"Essa atribuição inadequada da informação, nos reforça a dificuldade que temos em avaliar um conteúdo após sua propagação. Alguns estudos mostram que uma publicação com conteúdo factível leva cerca de duas horas para ser confirmada, enquanto os rumores falsos tendem a demorar cerca de 13 a 14 horas antes de serem desmentidos", diz o estudo do IT&E. "A partir desse cenário, podemos relacionar no mapa 'Propaganda Eleitoral na Internet no Brasil' os caminhos percorridos pela fake news que permitem visualizar a noção de realidade - atores, estoques e processos - do sistema em torno das eleições", complementa o insituto.

Abaixo, o caminho seguido pela fake news.

1. Validação

Uma parte relevante dos materiais que são divulgados nas redes sociais vem justamente de aparições dos principais candidatos na televisão. Exemplo disso foi o caso do vídeo que tomou a internet após a aparição do Bolsonaro no Jornal Nacional.

A afirmação de Bolsonaro de que o livro compunha parte do material do projeto e tinha intenção de ser distribuído pelo MEC ganhou a veiculação pelo comitê de campanha na própria página do candidato, pelas comunidades online e por influenciadores digitais cuja adesão acontece voluntariamente por empatia e de forma orgânica.

2. Viralização

A notícia ganhou aporte de indução com o aumento da velocidade da viralização ao inflar artificialmente o número de curtidas e compartilhamentos. Os usuários das redes sociais replicaram posts mostrando o interior do livro. Ilustrar a "fake news" foi uma estratégia de desinformação com a intenção de espalhar pânico e desconfiança entre as pessoas.

Essa indução alimenta diretamente estoques de menções, principalmente com a publicação de um fato inverídico que aumenta o fluxo das menções ilegítimas. Isso faz com que as agências de checagem verifiquem o conteúdo e informação que estão sendo compartilhados em rede.

3. Checagem

Para fortalecer a verificação dos fatos, são utilizadas informações, como a do Ministério da Educação (MEC) que já afirmou em diversas oportunidades que não produziu, adquiriu ou distribuiu tal material. Agências de checagem também elucidaram a questão, desmentindo as afirmações de Bolsonaro no Jornal Nacional.

Em nota de 2016, o MEC divulgou um esclarecimento às suposições atribuídas ao programa. Reforçando ainda que, em 2013, o Ministério da Educação já havia respondido oficialmente à imprensa. "A informação sobre a suposta recomendação é equivocada e que o livro não consta no Programa Nacional do Livro Didático/PNLD e no Programa Nacional Biblioteca da Escola/PNBE", informou a pasta.

4. Denúncia e Processo Judicial

Com a notícia checada, a fiscalização cívica entrou em ação por meio do posicionamento da coligação "O Povo Feliz de Novo" - que já conseguiu a derrubada de cerca de 100 URLs originais e mais de 146 mil compartilhamentos com alcance de aproximadamente 20 milhões de visualizações - juntamente com Fernando Haddad, com embasamento que oficializou a denúncia.

5. Remoção de conteúdo via condenação

Após os procedimentos de apuração e de condenação, o TSE, por meio do ministro Carlos Horbach, considerou a solicitação e ordenou a remoção do conteúdo ilegítimo com determinação de que o Facebook e o Google apresentem em 48 horas a identificação do número de IP da conexão utilizada no cadastro inicial dos perfis responsáveis pelas postagens, os dados cadastrais dos responsáveis e os registros de acesso.

Diz a decisão: "Nesse quadro, entendem comprovada a difusão de fato sabidamente inverídico, pelo candidato representado e por seus apoiadores, em diversas postagens efetuadas em redes sociais, requerendo liminarmente a remoção de conteúdo. Assim, a difusão da informação equivocada de que o livro em questão teria sido distribuído pelo MEC… gera desinformação no período eleitoral, com prejuízo ao debate político". O processo de decisão do TSE reforça a importância ao combate da desinformação nas eleições.

Ações

No "White Paper" do IT&E, a organização apresenta seis ações para o combate à desinformação, como alterar e criar ciclos de feedback. Uma dessas recomendações para o período 2019-2020 é cobrar da Corte eleitoral o desenvolvimento de amplas campanhas que eduquem o cidadão para combater a desinformação e reforce o real propósito do "Sistema de Propaganda Eleitoral na Internet" — que é informar os cidadãos a partir de conteúdos verdadeiros sobre o histórico dos candidatos, suas ideias e propostas.

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